Tudo que você sabe está errado! (uma metáfora barata para a realidade subjetiva/objetiva)

Havia um menino. Por conveniência, vamos chamá-lo de Carlos. Carlos era um menino paulistano de classe média. Como todo menino paulistano de classe média, Carlos tinha tudo que precisava para viver uma vida confortável e de acordo com o sistema: casa, roupas, educação, pais, televisão, computador, CDs, livros e (por último, mas não menos importante) dinheiro. Carlos não tinha um bom motivo para contestar a sociedade. Ele respeitava as vozes que vinham de fora. Mas Carlos tinha um problema. E o problema é que ele não sabia direito qual era o problema. Era uma espécie de incerteza, um incômodo, uma hipocrisia, uma voz que ficava em sua cabeça dizendo que ele era um merda e tudo estava errado. Afinal de contas, como todo menino paulistano de classe média que se preza, Carlos ouvia vozes na sua cabeça.

um dia um cara barbudo que devia estar muito puto da vida jogou uns aviões nuns prédios bem grandes e matou uma porção de gente as vozes da cabeça dele aproveitaram a oportunidade que esperavam a tanto tempo e começaram todas a gritar em uníssono TUDO QUE VOCÊ SABE ESTÁ ERRADO! e todo seu sistema de vida e organização social desceu pelo ralo e pela primeira vez elas tinham um ponto ele resolveu dar a elas uma chance já que o cara barbudo parecia saber o que estava fazendo mas elas não foram muito além disso e ele percebeu que ia ter que fazer o resto ele mesmo daí procurou outras pessoas que partilhassem de seu ponto de vista pra fazer alguma coisa qualquer coisa só que acabou descobrindo que essa merda de coisa não existe e que as outras pessoas ouviam outras vozes diferentes em suas cabeças e estavam afundadas em suas próprias pseudonóias e que ele estava sozinho e sempre esteve só sem sentido e tudo era na verdade uma puta confusão sem pontuação nem lógica alguma

Carlos então voltou para sua vidinha comum com pontuação, falsidade e comida industrializada. Aos poucos, as vozes na sua cabeça foram se aquietando e ele voltou a se submeter às vozes que vinham de fora. Carlos não sabe ao certo quem ele é. Mas ele quer acreditar que sim.

São Paulo
fim de 2003

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