Acordou subitamente, assustado. Olhou para o despertador. O ponteiro dos segundos não se mexia e o relógio estava parado exatamente às duas horas quarenta e dois minutos e quarenta e cinco segundos da madrugada. Seu quarto estava iluminado pelo sol que já nascera há algumas horas e penetrava pela fresta da janela. Ainda abalado pelo despertar, tentou avaliar a situação. Não haveria mais como assistir a maioria das aulas. Entrou debaixo da água quente do chuveiro e descansou mais um pouco. Sua mãe acabara de acordar também, e ele ficou prestando atenção a todos os pequenos ruídos que ela fazia andando pela casa. Quando saiu do banho, sua mãe já estava pronta para viajar, chamando um táxi pelo telefone. Vestiu um calção e foi para a cozinha. Não havia pão, então sentou e tomou um copo d’água. “O táxi já tá vindo vou descer e esperar lá embaixo.” Abraçou o filho e o beijou. “Se cuida e qualquer coisa me liga no celular.” “Pode deixar. Boa viagem.”
Ficou sentado sozinho um bom tempo, sem pensar em fazer nada, apenas escutando a quietude de sua casa. Nunca tinha reparado nisso, mas sentiu como se um grande vazio preenchesse o ambiente quando tudo estava em silêncio. Continuaria sentado durante horas, porém a fome foi mais forte. Trocou de roupa e quando saía do apartamento deparou-se com um estranho objeto em frente a sua porta. Um caixote. Não havia nenhum tipo de identificação nele; nenhuma marca, nem bilhete ou sinal. Apenas um caixote de tábuas de madeira com pouco mais de meio metro de altura, meio de largura e meio de comprimento. Achou que estivesse ali por engano e empurrou-o para frente da porta de seu vizinho.
Como tinha bastante dinheiro para passar a semana, não hesitou em comer tudo que queria na padaria fosse doce ou salgado. Partiu para a faculdade com um ânimo muito maior do que tinha normalmente. Acordar sem despertador, tomar um bom banho, comer o que quiser e ir para um compromisso por falta do que fazer, às vezes podem fazer isso com uma pessoa. Teve um dia agradável, assistiu a uma aula e saiu com seus amigos à tarde para o cinema. À noite, quando voltou de ônibus para sua casa, já estava cansado e tudo que queria era comer e dormir. Pegou o elevador como de costume e ao descer deparou-se com o mesmo problema pela segunda vez. O caixote. Estava novamente em frente a sua porta, exatamente como de manhã. Pensou que o vizinho talvez tivesse feito o mesmo que ele e teve uma idéia melhor dessa vez. Entrou em seu apartamento e ligou para o zelador, reclamando da presença do estranho objeto. Dentro de quinze minutos ele não estaria mais lá, garantiu o zelador.
Sentado na cozinha como havia feito cedo, ficou escutando o silêncio de seu lar. Entretanto, não era o mesmo silêncio da manhã; algo o perturbava, incomodava sua calma. Era o caixote. Não fazia barulho algum - pelo menos não da maneira que concebemos – mas a simples noção de que ele existia desviava o curso do silêncio das águas calmas para uma perigosa corredeira que às vezes nem se percebe. Olhou para a porta da cozinha que dava para o mesmo corredor onde estava o caixote. Estaria lá ainda? Talvez ainda estivesse lá. O olho mágico era convidativo, não precisava nem abrir a porta para se certificar. Preferiu ser racional e concordar que a essa hora o zelador já o deve ter retirado, e que provavelmente nada mais era do que uma encomenda extraviada.
A despensa tinha bastante comida, porém a maior parte era de alimentos que precisavam ser preparados. Fez uma comida e jantou razoavelmente bem. Antes de ir dormir, trocou as pilhas de seu despertador e ajustou o horário para acordar dentro da rotina no dia seguinte. No escuro de seu quarto, ficou tentando criar uma imagem mental do caixote, mas era impossível lembrar-se dele. Custou para dormir.
Estava dentro de um carro. Era o passageiro, mas não conseguia ver o motorista. Viajavam por uma estrada bem iluminada e aberta. Foi incapaz de distinguir se era dia ou noite, a luz parecia emanar da própria estrada. Havia muito barulho, tanto que mal conseguia saber de onde vinha. Fechou o vidro, porém isso não ajudou. Então ligou o radio. Tudo parou. O rádio tocava silêncio. Relaxou e observou a estrada. De repente, ela foi diminuindo e ao redor começaram a aparecer muitas árvores altas e retorcidas. A estrada deixou de ser asfaltada e o carro começou a pular muito. Tentou gritar, porém o rádio não permitiu.
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Que louco!!! :)
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